Médica é condenada por ter divulgado discussão com colega de trabalho
A sentença da 14ª Vara Cível de Brasília identificou que a ré extrapolou o direito de liberdade de expressão, ao gravar e repassar aos demais médicos gravação de conversa constrangedora que teve com a autora, na passagem do plantão médico
Por unanimidade, a 1ª Turma Cível do TJDFT manteve decisão que condenou médica a indenizar por danos morais uma colega de trabalho, após divulgar áudio em que ambas discutiam sobre tratamento a ser prestado a paciente. A sentença determinou também que a ré não voltasse a divulgar ou reproduzir a gravação, sob pena de multa.
De acordo com a autora, a ré teria repassado a gravação feita de maneira clandestina aos demais médicos da equipe, sob os cuidados do referido paciente. No áudio, elas teriam tido uma discussão acalourada e a autora afirma ter sido ofendida e constrangida com a exposição da conversa.
Conforme a decisão de 1ª instância, a conversa divulgada não afrontou a cláusula de sigilo ou informações sobre o paciente, sobretudo porque as informações técnicas foram repassadas a outros membros da equipe médica. No entanto, a sentença da 14ª Vara Cível de Brasília identificou que a ré extrapolou o direito de liberdade de expressão, ao gravar e repassar aos demais médicos gravação de conversa constrangedora que teve com a autora, na passagem do plantão médico. Avaliou, ainda, como desnecessária a divulgação para que a equipe pudesse discutir o melhor tratamento a ser adotado, uma vez que todas as informações necessárias à tomada de decisão estavam registradas no prontuário do paciente. Assim, a ré foi condenada a pagar à autora indenização por danos morais no valor R$ 7 mil.
A ré recorreu da decisão sob a alegação de que a gravação utilizada para fundamentar a condenação é inválida, pois teria sido adquirida por meio ilícito. Afirma que a enviou em conversa privada e individualizada aos médicos plantonistas que acompanhavam a paciente e que estaria coberta, portanto, pelo sigilo das comunicações, previsto na Constituição Federal. Discorda da análise feita do conteúdo da gravação, ao passo que nega haver registro ofensivo. Diz não ter sido sua intenção manchar a reputação da autora, tanto que só repassou a gravação para os quatro médicos plantonistas. Reforça que exerceu regular direito de asseguramento do interesse médico e preservação da vida e da saúde da paciente. Assim, pediu a revisão da sentença ou, subsidiariamente, a redução do valor dos danos morais.
A autora, por sua vez, recorreu para solicitar que o referido valor fosse aumentado para R$ 20 mil, tendo em vista que a atenuante de que a ré a procurou para conversar deu-se apenas após ter sido notificada da decisão liminar, ou seja, após a ação judicial. Observa que a gravação divulgada por meio de aplicativo de mensagens “tem o condão de causar males maiores, por chegar aos ouvidos de quem não foi destinatário original”, como de fato ocorreu e foi narrado por testemunha ouvida pela Justiça. Considera que a ré tinha como única intenção prejudicá-la ao divulgar a gravação. Reforça que o compartilhamento cessou apenas com a decisão liminar.
“Não demonstrada a utilidade da captação ambiental clandestina do diálogo que manteve a ré com a autora, nem a necessidade de divulgá-lo, nem a serventia de o dar a conhecer aos demais profissionais médicos, é de ser reconhecida a ilicitude da conduta praticada pela ré”, avaliou a desembargadora relatora. De acordo com a magistrada, o prontuário médico existe para atender a finalidade de registrar todos os procedimentos adotados por cada um dos profissionais no tratamento e assistência do paciente.
Além disso, a julgadora verificou que não foram encontrados elementos indicativos de que a autora estivesse atuando de maneira a comprometer as informações transcritas no documento, portanto, não se justifica o argumento apresentado pela ré de que realizou a gravação clandestina e a divulgou para se resguardar. “A falta de observância ao dever ético e moral que deve fundamentar toda e qualquer conduta privada ou social, bem como a desconsideração da boa-fé, que se identifica na insustentável motivação de que, com o registro gravado, atenderia a ré ao dever médico de informar os demais membros da equipe quanto aos procedimentos adotados, tornam inequívoco o interesse da ré de macular a reputação profissional da autora”, concluiu.
Dessa maneira, o colegiado analisou como ilícita a ação da ré, por ofender direito da personalidade ao colocar em dúvida, no ambiente de trabalho, entre os colegas, a competência profissional médica da autora. Os danos morais foram mantidos em R$ 7 mil. Caso descumpra a determinação de não repassar ou reproduzir a gravação novamente, poderá ser aplicada multa de R$ 3 mil, por cada divulgação, até o limite de R$ 30 ml.
Processo em segredo de Justiça.
Da Redação com informações da TJDFT