O Jogo do Tigrinho: O vício que está arruinando vidas no Brasil

O Jogo do Tigrinho: O vício que está arruinando vidas no Brasil

Usuários estão sendo abordados pelo Instagram e WhatsApp por ações de divulgação sobre o jogo, que funciona como um caça-níquel virtual.

Crescem no Brasil relatos de pessoas que perderam fortunas na plataforma online, enquanto influenciadores, inclusive crianças, são recrutados para atrair mais público para o jogo. Especialistas alertam para os riscos.

No interior de São Paulo, a enfermeira Gabriely Sabino foi encontrada na última sexta-feira (21/06) após passar uma semana desaparecida. Ela foi à imprensa ter fugido após contrair dívidas para investir no “jogo do tigrinho”, uma espécie de caça-níquel online. Apenas quatro dias depois, em Alagoas, dois influenciadores digitais foram presos, suspeitos de divulgar ganhos falsos e atrair jogadores para o mesmo jogo de apostas.

Casos como estes, que se repetem em outros estados, mostram a capilaridade que o jogo ganhou no Brasil e o desafio que se tornou não apenas para as autoridades policiais, mas também para os profissionais de saúde.

No Maranhão, onde influenciadores também foram presos no ano passado pelo mesmo motivo, a polícia ainda investiga suicídios que ocorreram após usuários perderem grandes quantidades na plataforma. Em pouco mais de um ano, o jogo avançou nas redes sociais e ganhou adeptos que dizem ter descoberto um escape nas apostas online.

Chamado oficialmente de Fortune Tiger, a plataforma desenvolvida pela empresa com sede em Malta, PG Soft, chama apostadores com uma forte promessa de ganhos rápidos e um design de jogo semelhante a um caça-níquel. O jogador tenta combinar três figuras iguais em três fileiras para receber prêmios em dinheiro. A quantidade é determinada pelos símbolos que aparecem na tela.

Inúmeros exemplos de problemas relacionados ao jogo preenchem as páginas do site Reclame Aqui, que reúne reclamações de consumidores sobre diversos temas. São dezenas de comentários só nas últimas semanas sob os termos “jogo do tigrinho”, “jogo do tigre” e “Fortune Tiger” que falam de dinheiro perdido ou que dizem que o jogo é desenhado para o usuário perder sempre. Outros alegam que não conseguiram recuperar os ganhos.

“Me tornei uma viciada em jogos de plataforma online. Estou tratando a compulsão com remédios psiquiátricos, terapias e já afundei a minha casa em dívidas”, escreveu uma usuária, que pediu que sua conta fosse restaurada.

A sedução do vício

Para o psiquiatra Rodrigo Machado, do Ambulatório de Dependência Tecnológica do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP), o ciclo vicioso causado pelo jogo precisa também ser visto sob uma ótica de saúde pública.

“A gente fica dependente não só de substâncias químicas, mas também de comportamentos altamente sedutores para o cérebro, as dependências comportamentais, como o transtorno do jogo. O jogo de azar tem esse potencial aumentado porque tudo que dá prazer vai impulsionar o sistema de recompensa cerebral, que processa e identifica a possibilidade de obter gratificação”, explica.

“O comportamento é muito sedutor porque envolve risco, pela possibilidade de obter um resultado final. Essa aleatoriedade traz uma alta excitabilidade, por não saber qual é o estágio final”, conta.

Com o tempo, o comportamento gerador de prazer modifica o sistema de recompensa, que precisa de mais estímulos, e algumas pessoas podem se sentir cada vez mais ávidas pelo risco, apostando mais dinheiro.

Esse formato de aposta é objeto de estudo há décadas. Em 2008, uma pesquisa extensiva feita pela Universidade de Nevada, nos Estados Unidos, apontou que a aposta online é mais viciante do que a feita em cassinos.

Para Rodrigo Machado, este é um dos riscos que o Fortune Tiger apresenta, já que o jogo tem todos os mecanismos dos jogos de azar, mas com o uso de um design de manipulação mais agressivo. No Brasil, o vício em apostas é identificado como uma doença pela Classificação Internacional de Doenças (CID-10), nas categorias jogo mania e patológico.

“Os desenvolvedores perceberam que poderiam atingir uma população mais jovem com a gamificação e com elementos estéticos modais extraídos dos jogos. O que difere ele do jogo de azar tradicional é que, em tese, o tradicional, como uma aposta esportiva, deve ser auditável, você precisa saber a probabilidade de ganhar”, completa Machado.

Crianças e adolescentes

O envolvimento de influenciadores no esquema é sintoma de como as redes sociais se tornaram verdadeiras plataformas de impulsionamento do jogo. O problema também avança sobre crianças e adolescentes, que acessam o jogo e usam o dinheiro de pais e responsáveis. Machado lembra que o risco de dependência é ainda maior para este público, cuja área cerebral responsável pela tomada de decisão ainda não está totalmente desenvolvida.

O Instituto Alana denunciou a Meta, detentora do Instagram, ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP), por permitir que a publicidade chegasse a este público. O documento mostra que as produtoras dos jogos contratam até influenciadores mirins, de seis a 16 anos, para divulgar o jogo, o que seria uma forma de mirar no público infantil para obter mais ganhos.

“Assim como os cassinos tradicionais, a distribuição de lucros pelos cassinos online depende da ampliação constante de sua base de jogadores, o que ajuda a explicar por que esses sites vêm contratando influenciadores de toda ordem, inclusive mirins, para direcionar publicidade de seus serviços a uma ampla gama de apostadores, até mesmo para crianças e adolescentes”, diz o texto enviado ao MP-SP.

A coordenadora do programa Criança e Consumo do Instituto Alana, Maria Mello, vê dupla ilegalidade no fato de crianças protagonizarem e serem atingidas por esse tipo de publicidade.

“São desafios enormes do ponto de vista da legislação, regulamentação. A gente precisa tomar medidas drásticas em relação à proteção de todos os brasileiros. É um problema que está gritando na sociedade”, afirma.

À Folha de São Paulo, a Meta disse que não permite conteúdos “potencialmente voltados a menores de 18 anos que tentam promover jogos online envolvendo valores monetários, e removemos postagens dessa natureza”. “Usamos uma combinação de tecnologia e revisores humanos para identificar conteúdos e contas que violam nossas políticas e estamos sempre trabalhando para aprimorar nossa abordagem em prol de um ambiente seguro para todos”, diz a nota.

O que diz a legislação

Jogos de azar não são permitidos no Brasil e são considerados crimes pela Lei de Contravenções Penais, definida como o tipo de jogo em que o ganho ou a perda dependem exclusiva ou principalmente do sorteio. As plataformas de caça-níquel online, no entanto, estão na maioria das vezes hospedadas em paraísos fiscais no exterior, o que dificulta a auditoria.

Elas funcionam de forma diferente dos jogos regidos pelo arcabouço legal de apostas online. Nesse caso, as empresas precisam ter sede no Brasil e o usuário deve ser orientado quanto ao risco de perda de valores ao jogar.

Nos casos em que se acumulam influenciadores presos por divulgar o jogo, a busca é por indícios de crime de pirâmide financeira, propaganda enganosa, estelionato ou mesmo sonegação fiscal. Alguns também são investigados por usarem uma versão “demo”, ou seja, forçada a vencer, dando a falsa impressão de que ganhar seja quase certo no momento de compartilhar o jogo com os seguidores.

Fonte: WD

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Lairson Bueno

Lairson Rodrigues Bueno, advogado OAB DF 19407, especialista em Direito Penal, atuando na região Centro Oeste, e, estados de São Paulo e Piauí. É formado em Direito pela UCDB - Universidade Católica Dom Bosco de Campo Grande (MS), cursou Estudos Sociais pela UFMS - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, e, Teologia pela FE - Faculdade Evangélica de Brasília, pós graduado em Direito Penal e Formação Sócio Econômica do Brasil pela UNIVERSO-Universidade Salgado de Oliveira de Niterói (RJ). Mais de 70 cursos de qualificação e atualização profissional. Cursou Espanhol Básico e advogou na fronteira com o Paraguai. Ex-funcionario do Banco do Brasil por 12 anos e de cargos comissionados nas Administrações Públicas por 10 anos. Ex-presidente das Subseções da OAB por 3 mandatos, sendo dois mandatos por Samambaia (DF) e um por Taguatinga (DF). Contatos: (61) 9-8406-8620 advbueno@hotmail.com

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